Publicações da WLSA Moçambique
Mulher e democracia: indo para além das quotas. O caso das eleições autárquicas de 2018
As eleições autárquicas de 2018 realizaram-se num contexto de pós-conflito armado em que não havia uma estabilidade política e social que permitiria que os actores políticos exercessem, em igualdade de circunstâncias, o direito a serem eleitos, por um lado, e que todos e todas tivessem uma informação antecipada sobre o novo quadro legal aprovado em Agosto 2018, por outro. Para além disso, a bipartidarização no debate público sobre as negociações para a paz influenciou negativamente a intervenção de outros partidos políticos, que se apresentaram às eleições num contexto desfavorável. É assim que as vozes dos dois contendores ocuparam todo o espaço de intervenção pública, incluindo os media, tanto os oficiais que produziam informação defendendo as posições governamentais, como os independentes que embora reflectindo maior diversidade das fontes contribuíram com alguma, e por vezes estranha veemência, para a marginalização das outras forças políticas.
Os nossos objectivos neste estudo prendem-se, em primeiro lugar, com a análise dos mecanismos de inclusão das mulheres nas instâncias partidárias e com as estratégias utilizadas pelas Ligas Femininas não apenas para aceder às listas de candidaturas, mas para impor uma agenda que defenda os direitos das mulheres. Significa que, para além das motivações e expectativas de mulheres e homens candidatas/os face ao poder autárquico, é importante observar o(s) modo(s) como os direitos humanos são introduzidos nas acções de captação do voto como é o caso dos tempos de antena e da campanha eleitoral. Com isto quisemos perceber se a ocupação do poder por mais mulheres corresponde não só a uma estratégia de resposta às reivindicações por quotas, por parte das Organizações da Sociedade Civil (OSC) e dos parceiros de cooperação, como também a uma exigência social pelo alargamento do campo político a novos actores e problemas. Em segundo lugar, é nossa intenção analisar quais os mecanismos de negociação entre as Ligas Femininas e da Juventude que podem, ou não, ter permitido que mais jovens sejam seleccionadas para as listas de candidaturas, e que perfis de mulheres e homens, jovens e menos jovens são tomados para aferir as representações sobre as qualidades que devem possuir os candidatos e as candidatas. Neste ponto, entramos na questão da atracção que o campo político pode exercer, diferenciadamente, sobre mulheres e homens e como a questão da idade interfere tanto na vontade de participação através das instituições partidárias, como na possibilidade de os partidos políticos se assumirem como espaços democráticos, aceitando e dinamizando a pluralidade de vozes como uma forma de captação do voto e de conquista do poder.
Do mesmo modo, procurámos responder e problematizar algumas questões consideradas fundamentais para compreendermos o processo eleitoral autárquico. A primeira questão constitui-se em torno do debate actual sobre o sistema democrático e cidadania, em termos não só dos seus princípios fundadores, mas, principalmente, na capacidade de reinvenção que permita maior participação, convivência e inclusão políticas. Do mesmo modo, serão discutidos os posicionamentos do(s) feminismo(s) relativamente à questão das quotas e à agenda de género. Pretendemos trazer para o debate a questão sobre as diferenças entre “melhorar” o quotidiano das mulheres, por exemplo com a construção de mais fontanários, ou responder a mudanças estratégicas que alterem as relações de poder e que permitam a construção de sujeitos de direitos. O debate teórico será confrontado com os discursos produzidos pelas e pelos entrevistadas/os.
Uma segunda questão tem a ver, como referimos anteriormente, com a análise dos novos dispositivos eleitorais, principalmente com o objectivo de trazer para o debate o modo como a definição de novos órgãos, as competências e as relações interinstitucionais contribuem, de facto, para o aprofundamento da descentralização e para o aumento da participação e do controlo das e dos munícipes sobre a realização dos planos municipais. Ou se, pelo contrário, a nova legislação reforça a centralidade do poder, não apenas no sentido de dependência dos níveis centrais de decisão governamental, mas também em termos de maior controlo dos partidos políticos e das suas clientelas sobre o poder executivo municipal. Do mesmo modo, serão analisados os resultados das eleições autárquicas tendo em conta o contexto em que se realizaram (forte bipolarização partidária), por um lado, e, por outro lado, o aumento da participação eleitoral e as alterações na distribuição geográfica do voto.
Autora: Conceição Osório
Colaboração: Ernesto Macuácua
Publicado em: 2019
Nº de páginas: 288
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- O livro foi lançado na Cidade da Beira no dia 26 de Agosto de 2019.
- Foi apresentado na Cidade de Maputo a 11 de Dezembro de 2019.