Breves
De como o governo perpetua estereótipos que subalternizam as mulheres
A Ministra do Trabalho, Emprego e Segurança Social, Vitória Dias Diogo, faz apelos às mulheres na qualidade de educadoras, realçando assim a divisão tradicional do trabalho, ancorada num sistema desigual e patriarcal.
A propósito da cobertura noticiosa sobre a onda de xenofobia na África do Sul, lemos no Jornal Diário do País, de 20 de Abril de 2015, que a Ministra do Trabalho, Emprego e Segurança Social, falando em Tete num encontro de mulheres, exortou-as a usar “o seu estatuto de educadoras da sociedade e como mães que são para dialogar com os seus filhos e outros intervenientes do mercado laboral de Tete que, porventura, estejam a trabalhar nas empresas implantadas naquela região com forte exercício da actividade da indústria extractiva, para que não retaliem [contra] os seus colegas estrangeiros”.
Se bem que as intenções sejam meritórias, pois se pretende evitar que a onda de violência se alastre ao nosso país, foi bastante infeliz a abordagem da Ministra. Com efeito, ao referir-se ao “estatuto de educadoras da sociedade”, ela mais não faz do que reforçar um sistema injusto e discriminatório, que relega as mulheres a uma função ligada à maternidade, ao cuidado dos outros e ao espaço privado.
Na estrutura patriarcal vigente, às mulheres e aos homens são atribuídas funções diferentes, com base em atributos supostamente femininos e masculinos, vistos como “naturais”. Esta divisão do trabalho com base no sexo das pessoas repousa, pois, em interpretações do que é ser mulher e ser homem, que influenciam não só o espaço doméstico mas também o espaço público. E a exclusão de mulheres de cargos e de funções tidas como masculinas, encontra justificativa nas “naturais” capacidades de umas e de outros.
Por isso é que, apesar das leis e das políticas públicas, as mulheres continuam a ser discriminadas e encaradas com desconfiança, sempre que ocupam cargos e funções “não femininas”. Por isso é que é tão difícil lutar contra a violência doméstica, a violência de género, a desistência escolar, etc.
E é também, por essas razões, que é indesculpável que uma Ministra se refira às mulheres como educadoras da sociedade e mães, quando essa é uma das funções que o patriarcado lhes reserva e que fundamenta a sua exclusão de outras áreas, tanto no espaço privado como público. Lembremos que a nossa Constituição, no seu artigo 36, afirma que “O homem e a mulher são iguais perante a lei em todos os domínios da vida política, económica, social e cultural”.
As mulheres devem ter o máximo de oportunidades, tal como os homens. Devem poder escolher ser ou não mães (a maternidade não é um destino mas uma escolha), casarem-se ou não, serem domésticas, operárias, funcionárias ou inclusivamente ministras. E o Governo não pode, através dos seus representantes, contribuir para a desigualdade de género e para o reforço de estereótipos discriminatórios.
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