Breves
Comunicado sobre as novas taxas para os media e os jornalistas em Moçambique
O MISA Moçambique e outras organizações emitiram hoje, dia 15 de Agosto de 2018, um comunicado público apelando para a revisão das novas taxas de licenciamento e de registo e denunciando a iniciativa como anti-democrática. Veja a seguir o comunicado na íntegra.
– COMUNICADO –
POSICIONAMENTO SOBRE O NOVO DECRETO (40/2018) DE LICENCIAMENTO E ACREDITAÇÃO DE JORNALISTAS EM MOÇAMBIQUE
Os profissionais de comunicação social nacionais e estrangeiros, as rádios comunitárias, empresas jornalísticas do sector privado, as organizações de defesa dos interesses da classe jornalística, organizações da sociedade civil defensoras das liberdades de imprensa e de expressão, bem como da democracia foram colhidas de surpresa com a publicação no dia 23 de Julho de 2018, do Decreto 40/2018 que estabelece o regime, licenciamento, renovação, averbamento, encartes publicitários pelos serviços de imprensa escrita, radiofónica, televisiva, incluindo nas plataformas digitais, bem como no de acreditação e credenciamento de jornalistas e correspondentes nacionais, estrangeiros e colaboradores autónomos, na República de Moçambique.
O processo de tomada de decisão sobre o Decreto, objecto desta petição, foi caracterizado por excessivo secretismo, sem a participação pública e acesso à informação, sobretudo os principias visados pelas taxas em questão, a classe dos jornalistas e os órgãos de comunicação social.
A tabela de taxas pelo licenciamento e registo de imprensa fixadas pelo Decreto em causa não respeitam quaisquer balizas legais, o que denota repugnante arbitrariedade na actuação da Administração Pública, cujo norte é a prossecução do interesse público, obedecendo aos princípios da legalidade e da justiça.
O Decreto em destaque não apresenta os fundamentos para a fixação das elevadas taxas nem tampouco explica em que medida tais taxas visam contribuir para a melhoria do exercício da liberdade de imprensa, de expressão e de informação de modo a efectivar o princípio do Estado de Direito Democrático constitucionalmente consagrado.
Os termos em que estão fixadas as taxas no Decreto revelam uma desconformidade com o princípio da gratuidade dos serviços públicos.
Este decreto surge numa altura em que o Governo anunciou mais dotações orçamentais para os órgãos públicos, pairando no ar a sensação de que a pretensão desta medida seja fragilizar, neutralizar e controlar a imprensa privada, fortificando a imprensa pública.
Igualmente, a medida é aprovada num contexto em que Moçambique está a regredir em vários rankings internacionais de liberdade de imprensa e de expressão.
Um dos argumentos do Gabinete de Informação (GABINFO) é que actualmente, enquanto entidade que regista as publicações e acredita os profissionais de comunicação sociais nacionais e internacionais, arca com os custos de licenciamento de órgãos de informação e é importante que haja comparticipação. Este argumento é muito frágil, na medida em que os custos de funcionamento do GABINFO devem ser asseguradas pelos Estado, em cumprimento do seu papel de protecção dos interesses dos cidadãos nos produtos mediáticos, isto é, o Estado deve garantir que o funcionamento do GABINFO seja feito pelos fundos públicos, não com receitas cobradas directamente aos media pelas taxas de registo e acreditação.
O decreto parte do pressuposto de que os media, em primeiro lugar, são um sector comercial e lucrativo; o que viola o princípio funcional e democrático do papel dos media – que são um espaço público que deve ser acessível a todos e promovendo a informação aos cidadãos a custo zero. Ao incrementar taxas de licenciamento, o Governo está a transmitir a ideia de que o produto dos media pode ser vendido a qualquer custo, o que viola o princípio de acessibilidade para os cidadãos, pois pode tornar os custos operacionais mais elevadas.
O papel dos estados sobre os media informativos não deve ser o de limitar, mas sim de facilitar ainda mais a sua acessibilidade aos cidadãos, assim como garantir que as operações dos media respeitem as necessidades de educação e participação dos cidadãos.
Regra geral, o sector dos media opera em “economia de escala”, isto é, tem elevados custos fixos de produção sobretudo na sua instalação, pois fortes investimentos em equipamentos e há taxas únicas a serem pagas e em investimentos iniciais que devem ser compensados com o tempo. Em poucos países, os media são sujeitos a pagar taxas anuais às entidades de regulação de conteúdos, devendo somente pagar os impostos correntes e, em alguns casos, há isenção a estes impostos. É importante não confundir a regulação e os custos de distribuição/emissão de conteúdos das empresas de comunicação que, na verdade está ligada ao Instituto Nacional de Comunicações de Moçambique (INCM), com as taxas de registo e de produção de conteúdos, em Moçambique operadas pelo GABINFO que deveria garantir que os media assumissem uma maior responsabilidade na prestação de informação de interesse público e estimulasse a sua diversificação.
O argumento aplicado para cobrar taxas às Rádios e TVs fundamenta-se no facto de usarem o espectro radioelétrico que é um aspecto preciosos pelos motivos tecnológicos que representa. É neste contexto que se considera razoável que entidades reguladoras como o INCM estabeleçam taxas anuais para as empresas de radiodifusão em decurso do uso do espectro radioelétrico. O não se pode aplicar ao GABINFO que, para além de não ser legalmente uma entidade reguladora, não lhe caberia o papel de cobranças de taxas para o funcionamento dos media em Moçambique; mas sim de aconselhar ao governo para que seja mais proactivo no processo de desenvolvimento do sector da Comunicação Social, em todos os níveis.
O direito à Informação não pode ser medido sob ponto de vista de valores monetários. Em todos os níveis, o regulamento está a dizer que a informação paga-se e as liberdades de criar jornais e cobrir eventos para o conhecimento de outros cidadãos do mundo sobre Moçambique deve ter custos.
Por exemplo, as rádios comunitárias que têm um papel importante para a democratização do acesso à informação, bem como para garantir o direito constitucionais dos cidadãos das zonas rurais de participação no debate democrático do país, através do acesso à informação. Com esta medida, a sobrevivência das Rádios Comunitária está minada. De notar que há menos de um ano, o FORCOM negociou com o INCM a isenção de taxas anuais do espectro radioelétrico às rádios comunitárias, porque quase nenhuma conseguia suportar estes custos.
O Decreto n.º 68/2016, de 30 de Dezembro, aprova o Regulamento de Taxas Regulatórias de Telecomunicações, onde no seu artigo 21, prevê de forma geral sobre a taxa anual de utilização de espectro de frequência rádioelectricas e, no artigo 24, de forma especial, em relação as rádios Comunitárias, nos termos do qual: as estações de radiodifusão comunitária estão sujeitas ao pagamento de uma taxa de licenciamento no valor de 5.000.00Mt sendo isentas do pagamento da taxa anual de utilização de espectro de frequência rádioelectricas.
Por incapacidade de pagamento, no período que antecede ao Decreto, as Rádios Comunitárias incorreram em multas e continuam devedoras, foi neste sentido que o FORCOM solicitou o perdão da dívida. Ou seja desde 30 de Dezembro de 2016 as Rádios Comunitárias estão isentas da taxa anual.
Por conseguinte, antes de saborear a vitória da isenção das taxas do espectro radioeléctrico, são impostas novas taxas às rádios comunitárias.
As taxas aos correspondentes estrangeiros visa, claramente, mostrar que Moçambique, no contexto global, pretende ser um Estado fechado; cuja informação sobre os acontecimentos locais deverá ser produzida pelas agências públicas locais, uma vez que os custos de entrada dos correspondentes estrangeiros passará a ser insustentável.
Geralmente, as revistas científicas, literárias e de outras formas de partilha e expressão de conhecimento que não visam fins lucrativos, mas sim educativos, em Moçambique, são registadas no GABINFO como periódicos. Como estas publicações irão pagar taxas, se o seu princípio de funcionamento não é comercial, mas sim educativo.
Nesse quadro, as associações, agremiações profissionais e/ou grupos de interesse, nomeadamente: CEPL (Comité de Emergência para a Protecção das Liberdades), MISA-Moçambique (capítulo moçambicano do Instituto de Comunicação Social da África Austral), AEJ (Associação das Empresas Jornalísticas-em restruturação), FORCOM (Fórum Nacional das Rádios Comunitárias), CIP (Centro de Integridade Pública) e OAM (Ordem dos Advogados de Moçambique), todas elas pessoas colectivas de direito moçambicano, notando que o Decreto 40/2018 constitui uma arbitrariedade prejudicial às liberdade de imprensa e de expressão e está enfermo de inconstitucionalidade, decidiram recorrer ao Provedor de Justiça para solicitar o PATROCÍNIO PARA APRECIAÇÃO, PELO CONSELHO CONSTITUCIONAL, DA INCONSTITUCIONALIDADE E ILEGALIDADE.
In: Newsletter MISA Moçambique – 15 de Agosto de 2018
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