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Brochura elaborada pela WLSA Moçambique sobre o problema da fístula obstétrica - um drama que atinge cerca de 100.000 mulheres em Moçambique.

Omitidas

Clique aqui para descarregar a brochura (em PDF)

Leia mais sobre fístula obstétrica

Contra a violência de género

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A sociedade civil manifestou-se na inauguração dos X Jogos Africanos

 

Comunicados pela “Pela Eliminação da Violência Doméstica”

Fórum Mulher, WLSA Moçambique, AMMCJ, MULEIDE

 

Publicado em “Outras Vozes”, nº 13, Novembro de 2005

 

Os cinco manifestos que se apresentam em seguida foram publicados entre Novembro e Dezembro de 2005 no semanário Savana

1º – Os agressores de mulheres não são anormais

Já não se pode negar, a violência doméstica existe e é exercida sobretudo pelos homens contra as mulheres que se encontram sob sua dependência. Respondendo a um ambiente mais favorável à recepção das denúncias e ao aparecimento de instâncias próprias para resolução deste tipo de conflitos, como os Gabinetes de Atendimento da Mulher e da Criança vítimas de violência (que funcionam nas esquadras) e algumas ONGs (entre outras, a AMMCJ, a MULEIDE, a Liga dos Direitos Humanos e a OMM) que prestam assistência legal, mais e mais vítimas de violência doméstica apresentam queixa. Sabe-se que são ainda muito poucas em relação ao número real de mulheres vítimas de violência, mas já se começa a perceber a magnitude do problema e é assustador o cenário que se desenha.

A violência verbal é uma constante em quase todos os casos, o que inclui insultos, desrespeito à dignidade, ao bom-nome e à idoneidade, ocasionando perda de auto-estima e falta de confiança. A violência de tipo sexual é também bastante frequente, com a agravante de não ser penalizada quando ocorre no âmbito conjugal, em que, segundo o Código Penal vigente, cai na classificação de “cópula lícita” (todas as relações sexuais são lícitas dentro do casamento).

A violência física é que tem ganho mais visibilidade, consistindo em agressões corporais, desde as mais simples às mais graves, até ao “cárcere privado” (privação de liberdade). Mais camuflada mas igualmente grave é a violência económica, que se traduz, por exemplo, na falta de cumprimento da pensão de alimentos e na retirada de bens comuns da família para outro lugar ou para fins desconhecidos por parte do marido ou do parceiro.

A vida das mulheres que sofrem de violência doméstica é sem esperança, sem projectos pessoais, sem alegria. Vivem subjugadas e deixam de acreditar nelas mesmas e até na capacidade das instituições que prestam este tipo de apoio ou serviços para resolverem o seu problema. Por um lado, existe a vergonha que sentem, porque, a ser sabido que são maltratadas pelo marido ou companheiro, começam a ser vistas como responsáveis pela situação: “o que é que ela fez para o marido a tratar desta maneira”? Por outro lado, as crianças que crescem em lares violentos, mesmo que não sejam o alvo directo das agressões (como acontece com frequência), são extremamente afectadas e crescem traumatizadas, muitas vezes com tendência a imitar estes comportamentos quando adultas.

Não há como negar esta situação e tem que se aumentar a consciência pública sobre o problema da violência doméstica. Não chega pensar simplesmente em reformas legais (que são urgentes), é necessário que se comece a compreender que este tipo de violência contra as mulheres só tem existência porque se funda em valores culturais e sociais que subordinam as mulheres e as relegam para segundo plano na casa e na sociedade. Vejamos alguns mitos sobre o assunto:

  • Os homens que batem nas mulheres não são anormais, pelo contrário, são indivíduos que agem de acordo com o sistema de valores vigente. Foram educados para exercer controle em casa, para serem o chefe de família, e nessa qualidade aprenderam que o uso da força é uma maneira legítima para impor a sua autoridade. Muitas vezes, para tentar travar ou recusar propostas que visam combater a violência doméstica, se ouve dizer: “Não é preciso ir tão longe, porque os homens que batem são uns poucos, pessoas meio doentes que necessitam de tratamento psicológico”. Este tipo de posições contribui para que o problema da violência não seja visto com clareza e concerteza que não ajuda à sua eliminação.
  • Os agressores não exercem violência indiscriminada, isto é, não são pessoas violentas que quando contrariadas reagem batendo em amigos ou nos colegas de trabalho. Estes indivíduos que batem nas mulheres são até pessoas ordeiras e bem comportadas nas suas relações laborais e informais. O que significa que batem nas suas esposas, parceiras ou namoradas porque aprenderam que o podem fazer, porque têm poder sobre elas.
  • Os homens não batem nas suas mulheres por terem ingerido alcóol ou outra droga que altere o seu estado de consciência. Evidências mostram que a ingestão deste tipo de substâncias funciona como um desinibidor, levando o indivíduo a cometer actos que já tinha em mente. Por exemplo, uma vítima de violência conta que quando o marido bebia e lhe batia, invocava motivos que já tinham surgido em discussões anteriores (ocorridas às vezes em anos anteriores) quando ele não se encontrava embriagado.

Se quisermos realmente combater a violência doméstica que se exerce sobre as mulheres, temos antes de mais de reconhecer uma verdade fundamental: as mulheres são as vítimas preferenciais deste tipo de violência porque na sociedade predominam valores patriarcais que sustentam uma hierarquia que dá poder aos homens, outorgando-lhe a prerrogativa de controlar a vida das suas esposas ou parceiras.

LUTEMOS PELA IGUALDADE DE DIREITOS ENTRE MULHERES E HOMENS!

2º – As mulheres não gostam de apanhar

Muitas vezes, quando se defende esta ou aquela proposta visando combater a violência doméstica ouve-se dizer que não vale a pena fazer nada, porque as mulheres gostam de apanhar. Inclusivamente, que se não apanham se zangam com o marido por pensar que este já não gosta delas. E dão-se exemplos deste tipo: “A minha mãe tinha uma vizinha que…”, ou então, “Havia na minha aldeia uma senhora…”.

Sem querer negar que podem haver algumas mulheres que pensem dessa maneira, essa ideia de que “as mulheres gostam de apanhar”, parece mais um mito posto a circular para legitimar o fenómeno da violência doméstica que se exerce sobre elas, por parte de quem tinha a obrigação de oferecer companheirismo e solidariedade.

Um sistema de dominação necessita de usar a força bruta para reprimir, constranger ou castigar. Mas para além disso, para se impor, precisa de um sistema de valores que convença os outros da justeza e legitimidade das suas normas e práticas. Os próprios oprimidos, educados para pensar o mundo dentro dessa ideologia, estão muitas vezes convencidos da razão dos seus opressores.

Por isso, quando falamos em combater a dominação masculina e a subordinação das mulheres, é fundamental ser-se crítico em relação à ideologia que serve de fundamento à persistência e reprodução do sistema patriarcal. Não basta fazer leis ou definir políticas públicas para mudar as práticas discriminatórias, há que ir mais a fundo e questionar os valores patriarcais. Para quê? Para pôr em causa as “verdades eternas” que procuram explicar as diferenças sociais entre mulheres e homens a partir do corpo.

É desta maneira que se devem analisar os mitos postos a circular sobre a violência doméstica e, dentre estes, o mais ingénuo mas também o mais persistente, de que as mulheres necessitam de apanhar para se convencerem do amor dos seus maridos ou parceiros.

Se alguém quiser confirmar, que visite os Gabinetes de Atendimento da Mulher e da Criança a funcionar em algumas esquadras do país ou as ONGs que atendem casos de violência doméstica e pergunte às mulheres aí presentes se gostam de ser constantemente espancadas, viver no terror sem saber o que é que devem fazer para evitar novas agressões e sofrer de ansiedade constante. Nenhuma deseja continuar a viver nesta situação de violência, mas a maioria nem sequer sabe que tem o direito, garantido por lei, à sua integridade física, à sua dignidade e ao seu bom nome.

Portanto, se queremos efectivamente fazer acabar com a violência doméstica que se exerce sobre as mulheres, devemos com igual empenho fazer leis e combater as mentalidades primitivas e antiquadas que continuam a classificar estas como seres de segunda categoria e até irracionais, que não conseguem conduzir as suas vidas sem a tutela masculina.

A violência contra as mulheres não é só um problema feminino. É um atentado ao projecto de civilização que queremos construir. Como tal, a sua solução deve exigir o compromisso de todas e de todos, da sociedade civil e do governo.

NÃO MAIS VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES!
LUTEMOS CONTRA OS VALORES QUE DISCRIMINAM EM RAZÃO DO SEXO!

3º – Os Direitos Humanos das Mulheres no Código Penal vigente

As leis reflectem sempre a moral e os princípios éticos de cada sociedade e de cada época. Reflectem também a correlação de forças entre os vários grupos de interesse. É isto que devemos ter em consideração quando olhamos para o Código Penal actualmente vigente em Moçambique. É que ele foi elaborado e entrou em vigor no século 19, tendo posteriormente sofrido algumas alterações pontuais.

Os valores morais e os princípios éticos que regem a sociedade moçambicana contemporânea e sustentam a ideia de democracia não vêm expressos neste instrumento legal. E a grande lacuna, o grande deficit, diz respeito aos direitos humanos das mulheres, que embora venham expressos na lei mãe, a Constituição da República, ainda não se traduzem nas práticas e nalgumas normas legais. Porquê? Porque estes direitos humanos ganham uma visibilidade tardia. Por exemplo, enquanto a maioria das pessoas reconhece que a discriminação com base na raça ou na religião é inadmissível, a discriminação por razão do sexo ainda é tolerada nalguns meios.

Dada esta situação, não é de estranhar que o Código Penal contenha lacunas quanto aos direitos humanos das mulheres. Mas hoje, numa altura em que as mulheres conquistaram o direito de exercer plenamente a sua cidadania e que o projecto civilizatório só é compatível com a igualdade de género, discriminações dessas já não podem perdurar. Há pois necessidade de fazer uma análise sistemática do Código Penal para identificar os grandes deficits e propor reformas.

Por outro lado, hoje em dia conhecem-se melhor os contornos que assumem certas formas de violência contra as mulheres, que devem ser tipificadas e penalizadas. Estamos a falar, por exemplo, do assédio sexual nas escolas ou em outros espaços, tanto públicos como privados, que se sabe que assumem proporções alarmantes. Pode-se também referir o incesto, o abuso sexual cometido em casa, que tem ficado sem a devida punição. Não podemos igualmente deixar de mencionar a violação conjugal, quando uma mulher é forçada a práticas sexuais que não são do seu agrado por parte do homem com quem contraiu matrimónio.

Estes são só alguns exemplos para mostrar que mulheres e homens são tratados de maneira diferenciada no Código Penal em vigor, o que constitui uma injustiça que deve ser corrigida, tal como prevê o plano do governo. Os cidadãos, independentemente do sexo a que pertencem, devem receber o mesmo tratamento perante a lei. E os problemas que os afectam, que por razão da própria maneira como a sociedade está organizada são diferentes, devem merecer um enquadramento adequado. As raparigas e as mulheres, com mais frequência vítimas de violência ligada à estrutura patriarcal da sociedade, necessitam de protecção legal para estes crimes específicos.

POR UM CÓDIGO PENAL MAIS JUSTO!
EM DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES!

4º – A violação sexual no casamento é um atentado aos direitos humanos

Na legislação actualmente vigente, desde que uma mulher e um homem tenham contraído matrimónio, qualquer relação sexual entra na categoria de “lícita”. Mesmo que o acto sexual tenha sido forçado e que o marido tenha violado a mulher. Esta disposição arcaica que chegou aos nossos dias data de 1866, quando foi elaborado o Código Penal que ainda é a base para o exercício do direito criminal em Moçambique. Não admira, pois, que contenha uma regra com este conteúdo, que dá direito ao cônjuge masculino de controlar o corpo da mulher.

Aliás, esta prerrogativa masculina também é reconhecida ao nível das culturas locais em Moçambique e muitos episódios de violência contra as mulheres, ao nível doméstico, são na realidade agressões sexuais. Agressões sexuais que ficaram impunes, porque ao nível do casamento, pela lei, esta forma de violência não aparece tipificada como crime e é legítima.

Esta situação deve ser rapidamente resolvida, em nome da justiça mais elementar para com as mulheres, a quem a Constituição garante plenos direitos como cidadãs deste país. Não é aceitável que embora possam votar e formalmente aceder a todos os níveis de decisão, as mulheres continuem privadas desse direito básico que é o de tomar decisões sobre o seu próprio corpo.

Mulheres e homens devem poder exercer a sua sexualidade de maneira livre e prazerosa, sem medos, sem receios e sem pressões. Todas e todos, sem excepção, devem poder decidir quando, como e com quem querem ter relações sexuais. Ninguém, absolutamente ninguém, deve ser forçado a práticas sexuais que não são do seu agrado, com as quais não tenha conscientemente concordado.

Existe a ideia, disseminada em alguns meios, de que os homens “naturalmente” têm mais desejos sexuais do que as mulheres, o que lhes daria legitimidade para dirigir e controlar o exercício da sexualidade do casal. Deste ponto de vista, como alguns têm defendido, a violência seria a recusa das mulheres às solicitações sexuais do marido ou parceiro. Antes de mais, a ideia de que os homens são mais vigorosos sexualmente quando comparados às mulheres é um mito, tal como tantos outros, construído para reforçar o poder masculino. Em segundo lugar, nenhum argumento pode servir de sustentação para que a sociedade aceite e institucionalize a violência sexual no âmbito do matrimónio.

Por tudo isto, porque acreditamos que só é possível desenvolvimento e democracia quando houver justiça para todas e todos, reiteramos:

  • Queremos uma sociedade livre de violência;
  • Queremos que os direitos de todas/os as/os cidadãs/aos sejam garantidos e respeitados;
  • Queremos que cada mulher e cada homem possa decidir sobre o seu próprio corpo e a sua sexualidade.

EM DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES!
NÃO ÀS RELAÇÕES SEXUAIS FORÇADAS NO CASAMENTO!

5º – É preciso punir o incesto

Cada vez surgem mais vozes a denunciar uma situação que até agora tem estado encoberta. Estamos a falar do abuso sexual e do assédio que atinge sobretudo crianças do sexo feminino ou raparigas, perpetrado por pais, padrastos, tios, irmãos ou outros familiares. No entanto, mesmo conseguindo provar-se a prática de tais crimes, as normas legais aplicáveis são as mesmas que se prevêem para qualquer agressor sexual, independentemente do tipo de relação que têm com a vítima.

Nós defendemos a necessidade de tipificar a agressão sexual cometida por um parente como incesto, tal como sucede nas leis penais de muitos países. Porquê? Porque o incesto é muito mais do que uma agressão sexual cometida por um estranho, por mais penosa e violenta que ela tenha sido. Quando o agressor é o pai, o tio ou o irmão, estes dispõem de um controle e poder sobre a vítima, que normalmente é uma menor que vive sob a sua dependência. Salientamos os seguintes aspectos:

  • O incesto é sempre mais do que um episódio de violência sexual, é uma dominação continuada que se exerce sobre a vítima a todas as horas do dia, que tem por finalidade garantir o seu silêncio e tê-la à disposição. Quase sempre um caso de incesto significa inúmeras agressões sexuais cometidas durante um largo período de tempo que pode estender-se até vários anos.
  • A vítima de incesto está mais desprotegida, porque não tem a quem queixar-se sem sofrer represálias do agressor. Por outro lado, a pessoa a quem deveria poder pedir ajuda é por vezes o próprio agressor. Casos já estudados de incesto mostram que quando a vítima se queixa e é desmentida pelo agressor, se se trata de um parente adulto, é neste que normalmente os outros membros da família acreditam.

Podíamos pegar ainda num outro aspecto e referir que o incesto é também uma traição. Traição por parte de quem tem o dever de proteger, traição à sociedade e aos valores democráticos. Um dos deveres mais importantes é de proteger as nossas crianças. Todos nós, cidadãs e cidadãos, somos pessoalmente responsáveis. Por isso, defendemos que o novo Código Penal tipifique o incesto como crime, com penas mais pesadas do que as previstas para outras agressões sexuais perpetradas contra menores.

As crianças têm direitos que ninguém, nem sequer a sua família, pode pôr em causa. O Estado, como garante do exercício destes direitos, deve zelar para que dentro e fora de casa todas possam viver em paz e crescer com dignidade.

PELOS DIREITOS DAS CRIANÇAS!

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Preocupado com o rumo que está a tomar a revisão do Código Penal, um grupo de organizações da Sociedade Civil diriguiu uma nota à AR. setacinza Carta da Rede de Defesa dos Direitos Sexuais e Reprodutivos
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Factsheet

Informação sobre os Direitos Sexuais e Reprodutivos das mulheres em Moçambique, recolhida pela Rede de Defesa dos Direitos Sexuais e Reprodutivos

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Mulher e Lei na África Austral - Moçambique