Breves
ONU-Mulheres lança Relatório “Progresso das Mulheres do Mundo”
Com o tema “Transformando economias, garantindo direitos”, o relatório “Progresso das Mulheres do Mundo”, que acaba de ser divulgado, discute os principais desafios que ainda persistem para assegurar a igualdade e os direitos das mulheres. Veja a seguir a introdução do relatório.
O relatório pode ser descarregado aqui.
Introdução do Relatório
Este relatório reflecte sobre o “Progresso das Mulheres do Mundo” num momento crítico, 20 anos após a quarta Conferência Mundial Sobre as Mulheres em Beijing, onde foi estabelecida uma agenda ambiciosa para avançar a igualdade entre os sexos. Uma vez que a comunidade global está a definir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) para a era pós-2015, o relatório faz um balanço e apresenta lições das experiências políticas no mundo para traçar uma agenda progressista para acção.
A visão sobre a igualdade de género, constantes do Declaração de Beijing e Plataforma de Acção, tornou-se uma realidade para todas as mulheres? Este Relatório baseia-se em experiências, evidências e análise de diferentes contextos nacionais e regionais para responder a esta pergunta. Ele revê os ganhos das mulheres na obtenção de igualdade perante a lei, o acesso à educação e outros serviços sociais; no aumento da sua visibilidade como actores políticos; na participação no trabalho remunerado e seus benefícios; e no maior reconhecimento público da dimensão e gravidade da violência por elas vivida. Mas ele também pergunta porque é que o progresso em garantir o usufruto das mulheres, na prática, de um conjunto de direitos económicos e sociais, tem sido tão lento e desigual entre os países e entre grupos sociais.
Numa época em que o mundo tem testemunhado impressionantes ganhos em riqueza material, porque é que a milhões de mulheres são negados os seus direitos até ao nível dos cuidados básicos de saúde, água e saneamento? Por que viver numa área rural continua a aumentar o risco das mulheres de morrer durante a gravidez ou parto? Por é que as mulheres têm mais probabilidades dos que os homens de não terem a segurança de uma renda na velhice? E por que estão a aumentar as desigualdades entre mulheres, deixando milhões de mulheres pobres para trás?
Buscando compreender porque é que o progresso no usufruto dos seus direitos por parte das mulheres tem sido lento e desigual, este relatório compartilha experiências de movimentos e de defensores dos direitos das mulheres em todo o mundo. As suas lutas sublinham como são persistentes e generalizadas as normais sociais discriminatórias, os estereótipos, o estigma e a violência, não permitindo que as mulheres e meninas em todos os lugares realizem o seu pleno potencial.
Múltiplas e crescentes desigualdades
A concretização dos direitos das mulheres não pode ser separada de questões mais gerais da economia e justiça social. O militarismo e os conflitos violentos, as crises financeiras e económicas globais, os preços voláteis de alimentos e da energia, a insegurança alimentar e as mudanças climáticas intensificaram-se as desigualdades e a vulnerabilidade, com impactos específicos sobre as mulheres e as meninas. A partir de 2011, um bilião de pessoas vive em extrema pobreza e muitos mais sobreviverão sem acesso a serviços básicos e protecção social, expostos a choques económicos recorrentes, crises ecológicas, epidemias de saúde e conflitos armados.
Ao lado da pobreza e vulnerabilidade, os níveis de desigualdade aumentam tanto ao nível nacional como entre países. Pode-se dizer que hoje o mundo é mais desigual do que em qualquer outro momento desde a segunda guerra mundial. Os 1% mais ricos da população possuem agora cerca de 40 por cento dos activos disponíveis, enquanto a segunda metade possui 1% ou menos. Estas desigualdades — que se contam entre os factores que detonaram a crise económica de 2008 — têm sido reforçadas pelas medidas de austeridade e pela recessão subsequente. Cortes nas despesas públicas deslocaram o fardo dos cuidados com a família e com o lar para os ombros de mulheres e raparigas.
O aumento dos níveis de desigualdade compromete o avanço dos direitos das mulheres, reforçando as desigualdades entre elas, e tornando mais difícil a união de forças para além da raça, classe ou outras divisões.
Não há empoderamento sem direitos
Uma grande variedade de actores — agências doadoras bilaterais e multilaterais, governos, organizações sociedade civil e, mais recentemente, o sector privado — abraçaram o objetivo do empoderamento económico feminino. Alguns veem nas mulheres um mercado inexplorado com grande parte dos consumidores, enquanto outros falam sobre a oportunidade de desencadear o poder económico e o potencial das mulheres como um meio para resolver os problemas persistentes causados pela crise financeira global e a estagnação do crescimento.
Sinergias entre o empoderamento económico das mulheres e maior prosperidade precisam de ser claramente incentivadas. Aumentar a posse e controlo sobre activos agrícolas e recursos produtivos das mulheres terá um impacto positivo sobre a segurança alimentar e sustentabilidade para todo o agregado familiar. A participação das mulheres na força de trabalho pode aumentar a competitividade das indústrias exportadoras. A pergunta fundamental, no entanto, é se os supostos cenários positivos realmente expandirão na prática o gozo dos seus direitos ou se, simplesmente, aumentarão o tempo de trabalho das mulheres, o conhecimento e desenvoltura para servir fins de desenvolvimento, sem qualquer benefício para as próprias.
Sem um quadro de monitoria solidamente ancorado em direitos humanos, é difícil saber se as reivindicações de capacitação das mulheres resistem a um exame minucioso. As normas de direitos humanos — estabelecidas num conjunto de tratados internacionais que a grande maioria dos governos voluntariamente ratificou – proporcionam uma base de vinculação a princípios aos quais os países devem prestar contas, independentemente das suas características económicas, sociais e políticas. É uma estrutura centrada em direitos e liberdades a que todos têm o direito em virtude de serem humanos. Este relatório sublinha, por conseguinte, a centralidade dos direitos humanos das mulheres como “fim” e como um “meio” eficaz de desenvolvimento.
Direitos indivisíveis, políticas sinergéticas
Este relatório também sublinha a indivisibilidade dos direitos. O foco é nas desigualdades socioeconómicas das mulheres, mas os direitos económicos, sociais, civis e políticos estão profundamente entrelaçados. Quando uma mulher deixa um relacionamento abusivo, ela quer justiça, mas também um lugar seguro para viver, receber cuidados médicos, e um emprego para que possa manter um adequado padrão de vida para si e para os seus dependentes.
O seu direito à habitação, saúde e trabalho são distintos mas indivisíveis. Os direitos económicos e sociais estão intimamente ligados com todos os outros direitos, especialmente os direitos civis e políticos que permitem às mulheres organizarem-se e fazerem reivindicações. Por outro lado, um ambiente económico aberto é uma base importante para a capacidade dos Estados em respeitar e responder a outros direitos.
Não somente apenas os direitos das mulheres estão perfeitamente conectados, como também as acções que permitem desenvolvê-los. Na prática, as políticas económicas e sociais têm que trabalhar em conjunto para se ser eficaz e permitir a realização dos direitos. No entanto, há uma tendência em separá-las artificialmente em debates políticos. O papel das políticas económicas, especialmente as políticas macroeconómicas, é visto principalmente em termos de promoção do crescimento económico, enquanto as políticas sociais supostamente devem tratar dos seus efeitos, endereçando a pobreza e a desigualdade.
Na verdade, as políticas macroeconómicas podem oferecer suporte a um amplo conjunto de metas, incluindo a igualdade de género e a concretização dos direitos humanos. A gestão macroeconómica é essencial para garantir a disponibilidade de recursos para apoiar a realização dos direitos e proporcionar oportunidades económicas. Por outro lado, os serviços sociais, tanto se prestados pelo governo, pelos privados ou pelos cuidados não remunerados e trabalho doméstico, têm efeitos económicos. Investimentos no desenvolvimento da criança, educação e saúde, melhoram a produtividade e contribuem para o crescimento sustentável. Transferências sociais, como pensões, abonos de família e subsídios de desemprego, têm efeitos multiplicadores positivos na economia, especialmente — mas não só — durante as recessões.
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