Breves
Comunicado da Frente Rio + 20 de Feministas e Mulheres
Está neste momento a decorrer a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável no Rio de Janeiro (Rio + 20), vinte anos depois da Cimeira da Terra que se realizou em 1992, na mesma cidade. Este evento conta com a participação de governos e de agências internacionais e de representantes de sectores privados e ONGs. A Rio + 20 tem uma importância fundamental para delinear estratégias de redução da pobreza e das desigualdades sociais, ao mesmo tempo que se assegura um desenvolvimento sustentável. Uma frente de organizações feministas e de mulheres emitiu um comunicado urgente.
Comunicado da Frente Rio + 20 de Feministas e Mulheres Convocadas no Território Global das Mulheres
Fonte: Varias organizações feministas e de mulheres
21/06/2012
Organizações feministas e de mulheres de diferentes países reuniram-se no Território Global das Mulheres na Cúpula dos Povos, para se manifestarem perante os governos que participam na Conferência do Rio + 20 a fim de denunciarem a violação sistemática dos compromissos mínimos assumidos na Conferência Eco 92 (Rio 1992) e as falsas soluções para alcançar um desenvolvimento sustentável baseadas na financiarização da natureza e o aprofundamento de um modelo de produção e de consumo que é injusto e insustentável. A urgência de limites naturais torna ainda mais dramáticas as decisões que os governos assumem para endereçar as causas estruturais da crise sistémica.
A crise global do sistema capitalista continua explorando os bens comuns, a privatização dos recursos naturais e a mercantilização dos direitos de acesso. Uma crise que tem as suas raízes na combinação perversa do capitalismo, patriarcado e racismo – sistemas que estruturam desigualdades e injustiças, a militarização, a divisão sexual do trabalho, o racismo ambiental, a violação dos corpos das mulheres, entre outras formas de dominação e exploração das mulheres no nosso mundo e nas nossas sociedades.
Esta crise é de civilização. Abrange elementos económicos e financeiros, mas também políticos, ambientais, culturais e sociais. Ela envolve a destruição da biodiversidade e dos recursos naturais, permitindo a consolidação de novas formas do patriarcado que incentivam e sustentam a criminalização da acção dos movimentos sociais.
Rejeitamos a imposição de um modelo económico e de desenvolvimento que gera e aumenta as desigualdades. Que destrói a natureza e a mercantiliza, inventando, cinicamente, uma “economia verde” que aumente as taxas de crescimento e o lucro dos mercados. Um modelo que prefere salvar os bancos e os banqueiros embora a precariedade e o desemprego deixem na rua milhões de pessoas. Um modelo baseado no lucro e na concorrência, onde mais importante do que a cidadania das pessoas é a sua qualidade de consumidores. Um sistema que se baseia em forças retrógradas e fundamentalistas para sair da crise que gerou.
O movimento de mulheres e feminista participou activamente na Conferência do Rio de 1992, lutou e está lutando todos os dias para efectivar os direitos humanos e, em particular, os direitos humanos das mulheres e questionar as bases do sistema capitalista. Os nossos movimentos não estiveram silenciosos durante todos esses anos, quando muitos governos e agências internacionais não cumpriram e não prestaram contas sobre os compromissos assumidos no Rio 92.
Rejeitamos a acção ilegítima do G20, que, reunidos agora no México, pretende trazer um pacote de medidas já definidas, sequestrando a democracia de um sistema internacional multilateral, estabelecendo uma agenda para o aprofundamento da financiarização do sistema económico e a mercantilização dos direitos, bem como o aprisionamento das corporações das Nações Unidas por multinacionais que procuram substituir os direitos que devem ser garantidos pelos Estados por serviços.
Exigimos que os governos e as agências internacionais presentes no Rio + 20 não retrocedam nos compromissos assumidos pelos Estados em termos de direitos humanos. Exortamos os Estados presentes nesta Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável para que tomem medidas eficazes e garantam os recursos necessários para implementar o que foi acordado em Viena 1993, Cairo 1994, Beijing 1995, Eco 1992 (Rio) e Durban 2001.
Exigimos a efectivação dos direitos humanos individuais e colectivos, dos direitos sociais, culturais e ambientais, dos direitos reprodutivos, dos direitos sexuais das mulheres e das meninas, dos direitos económicos, do direito à educação, do direito à segurança e à soberania alimentar, do direito à cidade, à terra, à água, do direito à participação política justa e igualitária.
Rejeitamos a falsa solução representada pela chamada “economia verde”, um instrumento que faz avançar e não retroceder o impacto predatório da mercantilização e a financiarização da vida, promovidos pelo capitalismo.
Finalmente, afirmamos que não reconhecemos a validade dos compromissos governamentais expressos na forma de programas mínimos, incapazes de cumprir com a responsabilidade pública que os governos e as agências internacionais deveriam assumir para assegurar os direitos humanos das mulheres. Não aceitamos paliativos, que se deixem intocadas as causas estruturais dos problemas sociais, económicos e ambientais, reproduzindo e agravando as múltiplas formas de desigualdade vividas pelas mulheres, bem como as injustiças socio-ambientais.
Não nos bastam nem objectivos reduzidos, tais como os ODM, nem aqueles propostos agora – os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável, que se propuseram fora do âmbito dos direitos humanos, abrindo caminho para a privatização e a participação de empresas multinacionais na sua concretização.
Exigimos a efectivação dos direitos de todos os povos do mundo aos seus territórios e aos seus modos de vida. Defendemos o direito das mulheres à igualdade, autonomia e liberdade em todos os territórios em que vivemos e especialmente aos nossos corpos, que é o nosso primeiro território.
Rio de Janeiro, 19 de Junho de 2012
Nota acrescentada em finais de Junho: Leia mais sobre o Rio+20.
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