Breves
O que não conseguimos dizer ao Presidente da República
No dia 21 de Fevereiro de 2008, em Maputo, no âmbito da Iniciativa Presidencial, teve lugar uma reunião com as mulheres. Estiveram presentes cerca de 500 participantes.
por: Terezinha da Silva
O assunto principal deste debate era o problema dos elevados índices de mortalidade materna, neonatal e infantil, que se registam no país. Aliás, de todos os indicadores de saúde, a mortalidade materna é a mais reveladora da desigualdade entre os países desenvolvidos e países em desenvolvimento, como acontece em Moçambique. Foi destacado que este problema está tido em conta nos Compromissos do Governo (Programa) e nos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio nº 4 e nº 5. Referiram-se duas causas indirectas que têm um peso importante na mortalidade materna: a malária e o SIDA e salientou-se que a morte de uma mãe (“mãe” e não “mulher”) constitui uma tragédia para a família.
Em seguida o Presidente da República afirmou estar aberto para escutar as ideias das participantes, o que tinham para dizer sobre a situação do país e propostas para mudar a situação.
Depois de se assistir a um filme sobre mortalidade materna, começaram as intervenções. Os pedidos eram feitos por escrito e entregues ao protocolo, mas o tempo não permitiu dar a palavra a mais de 12 pessoas. Levantaram-se aspectos ligados à saúde, a carências materiais, ao deficit em recursos humanos, à falta de maternidades, de transporte, e o comportamento pouco ético do pessoal de saúde. Uma intervenção, da Action Aid, levantou o caso do comportamento abusivo do régulo de Govuro que se “casou” com uma criança de 12 anos, o que foi justificado pelo administrador distrital como sendo parte da tradição e cultura. A Action Aid apelou ao Presidente para terminar com estes abusos que violam os direitos das crianças e raparigas.
Da parte da WLSA havia mensagens importantes a passar, nomeadamente:
- Embora seja pertinente referir a necessidade de melhorias nas unidades sanitárias, existem factores na sociedade que constrangem a saúde das mulheres e que são centrais, devendo ser considerados na planificação de acções, de forma a combater a mortalidade materna. Quer isto dizer que há que desafiar o modelo patriarcal que subordina as mulheres e que determina, por exemplo, que elas não tenham poder de decisão sobre o seu próprio corpo e vida.
- As causas da morte materna estão também ligadas ao aborto inseguro, aos preconceitos culturais e sociológicos, como as desigualdades de género, as uniões forçadas, e ao alto nível de violência sexual.
- Deve ser destacado igualmente e com muita urgência, que é insuficiente o atendimento da fístula obstétrica, uma consequência directa das gravidezes de adolescentes e das uniões forçadas com crianças de tenra idade (contrariando a lei criminal do país e a Lei da Família).
- Há necessidade de garantir que as mulheres exerçam o seu direito ao planeamento familiar, devendo ser repensadas as políticas de saúde, que actualmente carecem de uma perspectiva de direitos sexuais e reprodutivos. As mulheres são vistas como “mulheres-mães” e “mulheres reprodutoras”.
Outras questões importantes e relacionadas com o tema diziam respeito à justiça, concretamente ao papel mais activo que se deve ter na implementação das leis (idade de casamento, casamento como um contrato livre, etc.), à urgência de aprovar a proposta de lei para despenalizar o aborto seguro e à importância de Moçambique ratificar a Convenção 183 da OIT sobre a maternidade
Ao nível da educação, há que referir os contínuos abusos sexuais nas escolas, a premência em repensar as directrizes inconstitucionais sobre as alunas grávidas que as penalizam com a transferência para os cursos nocturnos, a necessidade de incluir a educação sexual desde os primeiros anos da escola secundária e não só educação moral e cívica.
Estas eram as mensagens que não pudemos apresentar. Esperamos que em próximas oportunidades seja concedido mais tempo para que os participantes possam ter mais espaço para expressarem as suas preocupações.
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